Arquivo: Julho 2009

A beleza
Sempre foi
Um motivo secundário
No corpo que nós amamos;
A beleza não existe,
E quando existe não dura.
A beleza
Não é mais que o desejo
Fremente
Que nos sacode…
- O resto, é literatura.

António Botto

julho arrefeceu os lençóis
madrugadas de papel forraram paredes

choro quando caminho por lisboa antiga
a grande avenida no início da noite
águas subterrâneas conduzem-me para o cais

hei-de esvaziar o tejo e enchê-lo novamente
pedir-te que escrevas um poema e o leias ao contrário
fazer acrobacias contigo na torre do castelo

adormecer esta noite numa rua de meninas
e acordar com as mãos cobertas de azul.

1999

O que eu sou hoje (e a casa dos que me amaram treme através das minhas lágrimas),
O que eu sou hoje é terem vendido a casa,
É terem morrido todos,
É estar eu sobrevivente a mim-mesmo como um fósforo frio…

(…)

Vejo tudo outra vez com uma nitidez que me cega para o que há aqui…
A mesa posta com mais lugares, com melhores desenhos na loiça, com mais copos,
O aparador com muitas coisas – doces, frutas, o resto na sombra debaixo do alçado,
As tias velhas, os primos diferentes, e tudo era por minha causa,
No tempo em que festejavam o dia dos meus anos…

Álvaro de Campos | Aniversário