Tentei fugir da mancha mais escura
que existe no teu corpo,
e desisti.

Era pior que a morte o que antevi:
era a dor de ficar sem sepultura.

Bebi entre os teus flancos
a loucura de não poder viver longe de ti:
és a sombra da casa onde nasci,
és a noite que à noite me procura.

Só por dentro de ti há corredores
e em quartos interiores o cheiro a fruta
que veste de frescura a escuridão…

Só por dentro de ti rebentam flores.

Só por dentro de ti
a noite escuta o que me sai, sem voz,
do coração.

David Mourão-Ferreira

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