Arquivo: 2012

estou no velório de todos. há panos brancos sobre os rostos e as ruas estão desertas. esta cidade é um engano. é isto. cheguei a lisboa em ruínas.

a morte é uma sombra de mulher com pesados brincos de diamante a insinuar-se nas cortinas.

desconheço os círculos que se desenham no chão e as linhas de água em redor dos meus pés.

o horror desta noite interminável e das lâminas que me atravessam. a manhã é um país longínquo onde chegarei só.

saio do trabalho e apresso-me à livraria mais próxima para comprar os teus diários.

abro uma página ao acaso – Amanhã, ou enquanto dormes, agora mesmo, vou pensar em ti intensamente – até que as horas me doam e o movimento do tempo fique suspenso, até que tudo o que me rodeia tome a forma do teu corpo.

faço o caminho de volta num esforço imenso para conter o choro. as tuas palavras outra vez, pela primeira vez.

quero ficar imediatamente doente para nada fazer senão ler-te.

lembro-me que notícia da tua morte me chegou por telefone e que chorei a noite inteira.