Hiroshima mon amour
ela diz que é o contrário, que ela não pode esquecê-lo.
que a partir do momento em que não se passa nada entre eles, fica a memória infernal
daquilo que não acontece.
Marguerite Duras
Hiroshima mon amour
ela diz que é o contrário, que ela não pode esquecê-lo.
que a partir do momento em que não se passa nada entre eles, fica a memória infernal
daquilo que não acontece.
Marguerite Duras
Anna Gaskell
A criança num saco de água quente.
Pouso-a na cama e embrulho-a em lençóis. Quente estarás.
Volto de hora em hora para medir a temperatura. Cansa-me os teus olhos sempre abertos, o balbuciar repetido nos meus ouvidos. Já percebi o que queres e desta vez que seja minha a vontade, afinal que podes tu?
Observo as alterações na tua pele, como se uma vindima inteira vivesse debaixo dela, secam-se os olhos e pareces de porcelana.
Está a anoitecer. É preciso voltar a ferver a água.
errámos as contas. o livro
que ficou por escrever
cria raízes cinzentas neste amor.
devolvo-te à lentidão da sombra
aos telhados de outra cidade.
veneza devolve-me a corrente das
águas e encontro-me pousada
sobre os meus dedos.
(alentejo, 2007)
saberás que para lá do trigo
existe uma criança em fuga.
o verão devolve-te a memória,
junto ao berço a boneca de porcelana.
há uma casa vazia estendida
sobre os anos. já nada se festeja e
existimos ainda.
há palavras que se repetem.
dizemos mar e amor até
esvaziarem. debaixo dos teus pés
estende-se a terra seca e
corpos de peixes de olhos laranja.
temos a lentidão dos répteis ao
longo dos braços. o tempo do
desejo para lá da vontade.