O ano passou e passou o primeiro dia do ano novo.
É verdade que já não espero muito. Só a literatura me teria salvo. 1 de Janeiro
Penso na morte ininterruptamente. Não quero estar aqui. Já não.
Estou cansada de sentir. Não aguento esta dor.
Ela disse que viria e não veio. 2 de Janeiro
Aterroriza-me esta fragilidade. 4 de Janeiro
Meu amor este amor é uma doença que se alastra. 7 de Janeiro
Onde está o meu limite? Porque me castigo ficando neste amor? 11 de Janeiro
Esta viagem era nossa. Sentada no avião rumo a Paris. A solidão é absoluta. E é preciso seguir em frente e não estou certa de querer seguir em frente. 14 Janeiro
A devolução da escrita. A escrita contra a loucura. 22 de Janeiro
É preciso aceitar a total destruição para te amar. 23 de Janeiro
Jamais alguém perceberá este amor. Nem porque é que os meus dias são tão vazios quando não estás.
A falta de forças que sinto diante de ti não é digna de ser vista. 24 de Janeiro
E se não me queres, porque insistes no meu nome? 25 de Janeiro
E foi sempre assim em cada regresso. Eu a acreditar, tu a não conseguires, nós a afastarmo-nos. 28 de Janeiro
Preciso fugir de ti. 1 de Fevereiro
Escrever contra a loucura. Escrever contra ti. Escrever contra o amor. Contra a tristeza, contra a passagem das horas, contra as saudades, contra a vontade, contra a memória, contra a imagem do teu corpo, os teus olhos, a tua boca, as tuas mãos.
É tarde agora. É demasiado tarde. Tarde para te amar. Tarde para deixar de te amar. 2 de Fevereiro
O mais desesperante já não é a tua ausência. É saber que irás continuar a reaparecer. 3 de Fevereiro
Respirar fundo e aceitar o silêncio. É preciso aceitar o silêncio.
Bater em qualquer coisa até que os punhos se abram. Até que a dor seja exterior também. 4 de Fevereiro
Arrumo a casa, lavo a loiça, faço o jantar, ponho a máquina a lavar.
É preciso continuar. É preciso continuar. 5 de Fevereiro
Morrer. Morrer. Morrer. 6 de Fevereiro
Um nó na garganta de tal forma que provoca dor. Mas não choro. 18 de Fevereiro
E a se a loucura desaparecer dos seus olhos amá-la-ei ainda? 23 de Fevereiro
Se deus existe, peço-lhe um milagre. 24 de Fevereiro
As palavras “eu mato-te” ecoam, não consigo parar de as ouvir.
É um caminho sem retorno. E não sei o que é andar em frente sem olhar para trás. 3 de Março
É por baixo da pele, muito longe de mim o que me dói. É por baixo da pele, muito longe de mim que estou. 4 de Março
O que significa nunca mais? 5 de Março
Duas e vinte da manhã e eu amo-te. Duas e trinta da manhã e eu amo-te. 11 de Março
Tão cansada deste amor. 16 de Março
Quatro dias para me relembrar como é perfeito quando estamos bem. Esta certeza irrefutável do amor. E o que fazer com esta certeza?
Disse-lhe “esvaziaram-me por dentro e só ficaste tu”. 22 de Março
Às vezes tenho vergonha de amá-la. 27 de Março
O teu corpo já não é um segredo que encerro.
À força de tanto te dares gratuitamente o teu corpo gastou-se noutras mãos.
e as tuas mãos no meu corpo já não são uma descoberta do teu prazer. São sons repetidos em vozes diferentes cada noite. 28 de Março
Em que parte do caminho te esqueceste de mim? Em que parte do caminho deixámos de ser únicas uma para a outra?
Já nada é possível e permanecemos ainda, presas à perfeição de um amor que julgámos eterno. 29 de Março
Respiro o vazio. Respiro este amor que me esvaziou. 1 de Abril
O amor existe apesar de. 2 de Abril
Quando ela não está o mundo inteiro é ausência. Quando ela está o mundo inteiro é ausência. 5 de Abril
De nada me vale um amor que abandona. 7 de Abril
Valha-me o mundo para assegurar-me que não estou louca. 11 de Abril
Estava como queria estar. No início do precipício. Viva. Com ela. Louca de desejo. 17 de Abril
Este amor devolve-me. Mesmo quando repleto de dor. 19 de Abril
O que estou eu a permitir? 29 de Maio
Atiro uma garrafa contra o chão e os vidros espalham-se por toda a sala, ao redor dos meus pés. Leva-me ao limite. 30 de Abril
Há momentos em que penso que se é para ser assim, deixem-me ser triste de uma vez. 31 de Maio
Falho-me. 28 de Junho
Que amor é este? 22 de Agosto
“tudo o que disseres poderá ser e será usado contra ti” 29 de Agosto
Não sinto nada. Não me comovo. 5 de Setembro
Tenho de lembrar-me disto: estar com ela faz-me mal. Quando as saudades vierem tenho de lembrar-me destas noites em que me deixa só. Este vazio. Esta tristeza. Esta certeza. 10 de Setembro
O tempo estende-se. Esqueço-me de tudo. Não penso, deixo que as horas passem muito lentamente. 13 de Setembro
Estou mentalmente exausta. De tal forma que até fisicamente me sinto exausta. 17 de Setembro
A raiva que preenche tudo, que se alastra pelas ruas, a sensação de nojo no corpo, os olhos verdes presos a mim, o delírio, a violência, o amor que se cola contra a minha vontade. 3 de Outubro
A noite é um lugar de perigo para os que amam. 7 de Outubro
Meu deus, que pesadelo. 8 de Outubro
Foi arrancada parte de mim. Levanto-me e continuo. Mas não estou inteira. 10 de Outubro
Neste momento, sei tão pouco de mim. 14 de Outubro
É mais forte que eu. Como é que é mais forte que eu? 17 de Outubro
Morro por notícias dela. Morro dela. Dos olhos dela. Mas continuo. 19 de Outubro
Não sei se estou preparada para o que a terapia pode fazer de mim. Não sei o que é uma versão mais equilibrada de mim. 27 de Outubro
Sou tão apaixonada por ela hoje como há um ano. Ou muito mais. 27 de Outubro
Rezo para que não me diga nada, para que não apareça e ao mesmo tempo tudo o que quero é que apareça. 3 de Novembro
Ganharei eu lucidez para deixar de a querer? E quem eu sou, não se perderá também? 6 de Novembro
Construo defesas por dentro de mim. É como se mil estradas dentro de mim existissem. Faço meio caminho, encontro-a, construo um muro, sigo por outra estrada. 8 de Novembro
Todos os seus movimentos me ferem. Os que faz, os que a memória me traz, os que imagino. 15 de Novembro
À espera dela. A tremer. 28 de Novembro
Olhamos uma para a outra e dizemos ao mesmo tempo “amo-te”. 29 de Novembro
O que me salva deste amor quando só este amor me salva? 2 de Dezembro
Existirá alguma felicidade que dure mais que minutos? Ou será que tudo tem de estar sempre repleto de dor?
Este amor é uma armadilha. Uma vertigem, uma queda livre constante. 7 de Dezembro
Não há nada de novo aqui. Estar com ela é uma repetição. Já não é inteiro estar com ela. 9 de Dezembro
Vinham ter comigo. Puxavam-me para dançar. Tantos corpos ao meu redor. Sentia-me eu, sem precisar de ninguém. 10 de Dezembro
Que venham outros corpos. Sinto uma sexualidade excessiva em mim. 13 de Dezembro
Quero fugir do mundo real e viver só de histórias. 14 de Dezembro
Parar e olhar um rosto. Ter a noção do outro. E perceber que esse outro não é ela. 21 de Dezembro
Mensagem dela: “Em tua casa. Meia hora”. 27 de Dezembro