a vida toda fodida – e a alma esburacada por uma agonia tamanho deste mar.
al berto
a vida toda fodida – e a alma esburacada por uma agonia tamanho deste mar.
al berto
Não tardará a chegar ao fim
este agosto que te viu passar com a luz
a teus pés. Somos eternos, dizias.
Eu pensava antes na danação
da alma ao faltar-lhe o alimento
que lhe trazias. Agora a cidade vive
do peso incomensuravelmente morto
dos dias sem a tua presença. Deixo
a mão correr sobre o papel tentando
captar o eco de uma palavra,
um sinal de quem em qualquer parte
cintila, e confia ao vento o segredo
da nossa tão precária eternidade.
Eugénio de Andrade
se ao menos Lisboa esvaziasse de repente e eu pudesse nela caminhar. sem nenhuma voz, sem nenhum rosto.
este corpo em que me escondi
gastou-se
al berto
todo o amor do mundo não foi suficiente porque o amor não serve de nada.
josé luís peixoto
A embriaguez é um momento de vida incendiada, ou suspensa, e a ressaca um tempo de lenta e demorada reconciliação com o mundo, e comigo mesmo.
al berto
e eu caio, sem rede, olhar dela adentro.
O tempo. A mãe que era uma mulher jovem, o riso das crianças, a mesa cheia no dia de aniversário. O tempo arrasta-nos como as ondas levam o que está à beira mar. Nada que é levado volta a aparecer.
E como deixar de estar sentado na areia, a olhar o mar, à espera que ele nos devolva aquilo que tirou?
Estas pedras que soçobram dentro do tempo até onde vão arrastar-me?
O mar o mar quem poderá esgotá-lo?
yorgos seferis
Ainda mais um poço dentro de uma caverna.
Outrora era-nos fácil extrair ídolos e adornos
para se alegrarem os amigos que nos permaneciam ainda fiéis.
As cordas romperam-se; apenas sulcos na boca do poço
nos lembram a nossa felicidade passada:
os dedos no murete, como dizia o poeta.
Os dedos sentem a frescura da pedra um pouco
e o calor do corpo conquista-a
e a caverna joga a sua alma e perde-a
a cada momento, cheia de silêncio, sem uma gota.
yorgos seferis