fragmentos do diário VIII – breves de 1999

Desci a avenida, até ao Tejo, e chorei. 17 Janeiro

Ainda amo “R”. São três da manha e neste momento amo “R”. Para amanhã amar talvez menos e ela amar talvez mais. 11 Fevereiro

Tenho quem quero e quem não quero. Isto farta. E dou por mim só. Sabendo que podia ter alguém, que há mesmo alguém que sofre por mim. Mas nada me completa. 20 Fevereiro

Somos nós que andamos roubados na algibeira do passado. 4 Março

“Isto nunca vai acabar, pois não?” – diz-me “R” 5 Março

Véspera da viagem para Paris. “R” aparece aqui de madrugada com um profundo corte no pulso esquerdo. 31 Março

Paris deslumbra. 1 Abril

É como um grande truque de magia, podes até tocar-lhe, sem no entanto teres ainda a capacidade para o perceber.
Paris sente-se. Explode dentro de ti e ultrapassa-te. 7 Abril

Sou atraída para o sexo bruto, para o prazer imediato e depois fico desiludida com a falta de sensibilidade. 23 Maio

“A” está no hospital. Se atirar um objecto contra a parede e ele se partir, acordarei, e tudo estará bem, como antes. 23 Setembro

“S” apareceu no momento exacto da minha queda. Deixei que ela me amasse, e permiti-me amá-la. 30 Setembro

Deixei de saber escrever poemas que não sejam para “R” 20 Outubro

Mesmo tendo a certeza que “S” não é a meia-lua, sinto que corro o risco de ficar com ela durante muito tempo. 20 Outubro

“S” ama-me como um dia amei “R”. O amor devasta. O mais que posso dar-lhe é pouco. 25 Outubro

Amar será ainda viver? 26 de Outubro

Amo “S” com um amor tão calmo que às vezes duvido se será amor. 5 Dezembro

Congelei a matrícula este ano. Todo um castelo que durante anos construí e agora, conscientemente destruo. 5 Dezembro

Preciso dos livros, preciso de mim. 11 Dezembro

Volto a sonhar com Tirana e acordo a chorar. 11 Dezembro

Já não há o desejo de sair à rua, de dançar até de manhã, de fazer amor com mulheres diferentes todos os dias. Há antes uma necessidade de uma cadeira e uma mesa, onde possa sentar-me e longamente escrever, numa solidão e silêncio absolutos. 13 Dezembro

Tudo se resume a isto: escrever. Nada sou, nem nada quero ser, se a escrita me falha. 15 Dezembro

Desde sábado que não vejo a luz do dia. Como condenada ao sono. 16 Dezembro

Depois de quase 30 horas seguidas a dormir, aceitei finalmente ir a um psiquiatra. 21 Dezembro

Sentei-me num sofá, melhor – enterrei-me num sofá. Fui obrigada a responder a perguntas sobre a minha vida. Saí de lá com uma depressão diagnosticada. 26 Dezembro

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