fragmentos do diário IX – breves de 2000

Se já é estranho escrever “1 de Janeiro”, escrever “2000″ provoca-me arrepios no corpo. 1 Janeiro

O horizonte é feito pela linha do teu sexo. 16 Janeiro

Respiro mais fundo quando estou com “S”. 1 Fevereiro

Incapacidade de entender como alguém me quer tanto, por tudo o que sou. Sem fugas. 14 Fevereiro

Nunca foi tão real o amor. 14 Fevereiro

De que substância pode ser feito tanto amor? 23 Fevereiro

Terá Anais realmente amado? Como poderia então acreditar que havia espaço para mais pessoas? 19 Março

“R” morreu em mim. A chuva fez desaparecer por fim o perfume dela da terra. 28 Março

Um corpo demasiado frágil. Um corpo finito em que não caibo.
Um corpo que treme ao ser tocado.
Facilmente deixam marcas neste corpo, incapaz de as apagar ou viver com elas.
Magoo-me nas paredes internas do corpo que não me dão espaço para abrir os braços. As asas do albatroz são demasiado grandes para que ele as carregue, como castigo de Atlas.
Não posso carregar o mundo se não me der ao mundo e deixá-lo entrar em mim.
Nem todas as imagens encaixam com os gestos neste jogo.
Fumar pólen, ficar deitada às escuras, ouvir a minha respiração, cortar os pulsos devagar, um de cada vez, quase como um momento de amor.
Ficar extremamente quieta depois de partir todos os objectos pessoais e bater com os punhos na parede.
Chorar de vez em quando, ao telefone, até que as lágrimas me sejam doces.
Amá-la assim. Se me esvaziassem por dentro ela continuaria.
16 Abril

Estremeço. O corpo não responde mesmo depois de dois calmantes. O coração descompassado. Dorme comigo. Peço-te. Desenha a loucura nas paredes do meu quarto. Deixa-me partilhar contigo todo este silêncio. Como dádiva maior. 21 Maio

Quando estou triste não posso estar senão só. 12 Junho

Sim, as palavras deixam de as ser quando as repetimos em excesso. E tudo em mim são sons a estalar na memória, esqueço-me de mim e porém continuo a existir.
Este diário não aberto durante cinco meses. Poderiam ser cinco anos, certamente seria o mesmo.
O cansaço deste silêncio da poesia. Se todas as vidas eram minhas, agora, sem as palavras não posso estar senão só. 5 de Novembro

Até quando estas ausências, este estar sem mim? 10 Novembro

Saudades de tudo. A primeira noite com “B”, o primeiro charro pela boca de “R”, os sábado à noite. E não é isto uma vontade de voltar atrás no tempo, mas uma dor de não poder já viver isto pela primeira vez.
Poesia pérola de marfim afundada em mim. 25 Dezembro

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